Contribuição da Igreja não interessa a quem domina a comunicação, diz assessor dos bispos

Entrevista exclusiva com o assessor de comunicação da CNBB sobre o Dia Mundial das Comunicações

01 de Maio de 2018

 

As transformações provocadas pelas comunicações têm afetado o jeito da Igreja se relacionar com os fieis e o mundo em geral. Sentindo a força dessas mudanças, desde 1967 o papa publica uma mensagem para o Dia Mundial das Comunicações. Neste ano, em sua 52ª edição, que ocorrerá no dia 13 de maio, Francisco escolheu o tema “‘A verdade vos tornará livres’ (Jo 8, 32). Fake news e jornalismo de paz”.

 

Em resposta ao papa, a Igreja no mundo todo se coloca em reflexão sobre a mensagem enviada. Foi o que aconteceu durante a I Jornada de Comunicação e Evangelização, organizada pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), em Belo Horizonte, neste sábado (28).  O evento contou com presença do padre Rafael Vieira, assessor de comunicação da CNBB, que concedeu entrevista a equipe do Dom Total.

 


Os meios seculares se ressentem da aproximação da Igreja em relação aos diversos temas quando ela se coloca como “mãe e mestra”. Em época de interação, de diálogo, de razão comunicativa, como a Igreja pensa sua comunicação com os outros setores da sociedade?


No pano de fundo da comunicação da Igreja está o desejo de estabelecer esse diálogo. A Igreja está sempre aberta. O anúncio do Evangelho é fundamentalmente abertura, diálogo, ir ao encontro das realidades desse mundo. Na comunicação isso não poderia ser diferente. Encontramos nela, do mesmo modo que em todas as outras áreas da pastoral, da missão da Igreja, esse desejo de estar próxima das realidades que o homem vive e discutir com cada uma delas, estabelecer aqueles elementos que vêm propriamente da experiência cristã. Isso está no pano de fundo.

 

Eu falo a partir de um lugar. Trabalho na conferência dos bispos e noto que todo esforço comunicativo feito pela conferência está marcado pelo desejo de dialogar, pelo desejo de estabelecer uma ponte com todas as outras forças vivas da sociedade. É claro também que há o outro lado. A sociedade (pelo menos) aparenta estar cada vez menos interessada nesse diálogo porque as forças que têm predominado na comunicação geral não têm valorizado aquilo que a Igreja pode oferecer como contribuição.

 

Há, de um lado, o desejo muito grande que é concretizado por iniciativas bem reais: há uma assessoria de imprensa, há uma colocação permanente do pensamento e do posicionamento dos bispos, mas a gente nota – com certa tristeza – que não há muito eco dentro da sociedade daquilo que a Igreja apresenta.

 

Você falou também pelo fato da Igreja se apresentar como “mãe e mestra”. Essa comunicação predominante não parece estar muito interessada em ouvir “mãe” e muito menos “mestra”. Então, por isso, justifica-se certa distância. Contudo, da parte da Igreja, insistentemente, perseverantemente, há disposição de ir ao encontro da sociedade.

 

Os veículos de comunicação com maior repercussão no Brasil no âmbito eclesial são mais ligados a setores mais conservadores ou, até mesmo, tradicionalistas, que mostram apenas um viés da Igreja. Como a comunicação da CNBB pensa em dar visibilidade a outras teologias, a outras eclesiologias?


A própria composição do episcopado já é uma resposta para isso, porque encontramos bispos com perfis diferenciados e, na CNBB, esses bispos colocam tudo em comum. O trabalho que a gente faz lá precisa ser, basicamente, plural, aberto, para justamente apresentar o perfil de um episcopado que tem uma riqueza, uma diversidade, bispos que têm posicionamentos muito singulares, diferenciados uns dos outros – não na essência, mas naquilo que você menciona de teologias e espiritualidades muito diversas que a Igreja tem.

 

O importante é que lá na CNBB se procura saber o que é consensual. Nesse aspecto, ela dá uma resposta um pouco diferenciada dessas teologias e espiritualidades particulares. Ali se procura – e eu penso que é isso que está muito presente na comunicação que se faz na CNBB – o que é fundamentalmente eclesial, quer dizer, aquilo que é o ponto comum. Por isso também é preciso se abster muito dessas particularidades, porque é necessário colocar em relevo constante, em destaque, aquilo que une a todos, aquilo que é básico.

 

Dessa forma, lá se tem muito cuidado com a questão doutrinal porque esse é um ponto comum. Tem-se muito cuidado com a questão da Eclesiologia no seu sentido mais amplo, quer dizer, de abrigar todas essas riquezas representadas por essas eclesiologias diferenciadas. Mas na CNBB a busca permanente é de comunhão; de participação, mas também de muita comunhão, de encontrar os elementos que fazem uma convergência eclesial. Essa é a marca da comunicação lá.

 

O papa, na mensagem para o dia mundial das comunicações de 2018, fala sobre Fake News. Quando são grupos católicos que espalham ou produzem esse tipo de notícia, o que a Igreja pode fazer?


Penso que, em primeiro lugar, a reação não precisava ser esperada dos bispos. Considero até certa injustiça, porque nós todos somos Igreja. Os bispos compõem uma parte importante da Igreja que é a hierarquia. Mas quando grupos católicos começam a levantar informações que não têm fundamento ou a fazer acusações que estão desprovidas de qualquer racionalidade, penso que a primeira reação deveria ser dos próprios leigos, quer dizer, da base da Igreja. Temos que olhar para nós mesmos e dizer: Escuta aqui, será que a gente está falando certo? Será que isso tem procedência? Será que o que a gente está falando tem fundamento?

 

Tenho pensado muito a respeito de Fake News e dessas verdadeiras milícias que temos hoje na Internet, que ficam vasculhando a vida de todo mundo. Fico pensando... Tem um pensamento de São Paulo que está sendo esquecido. Em primeiro lugar, quando um irmão falha, não vamos para a Internet falar da sua falha. Nós procuramos o irmão. Nós conversamos com ele. Tentamos apresentar nosso ponto de vista que, depois, pode até ser mudado, porque no diálogo com ele, que achamos estar errado, pode vir informações que não temos.

 

Depois, diz o apóstolo Paulo, se o irmão não se emenda então se procura a Igreja, procuram-se outras pessoas. Esses que estão fazendo tanto barulho estão se esquecendo do ensinamento de São Paulo, têm uma suspeita e já vão logo jogando na Internet e isso não tem nada a ver com o ensinamento do apóstolo.

 

A Igreja se organiza territorialmente (paróquias, dioceses). Ela está preparada para a Evangelização na Web? Ela já entende a Web como um lugar não como um meio de comunicação?


Eu penso que ainda não. Precisa chegar a isso, mas ainda não está. Na maior parte desses territórios isso ainda não foi bem compreendido. Eu digo isso porque, se você observar um pouquinho o painel das dioceses do Brasil, você vai encontrar uma ou outra que já tem um trabalho comunicativo muito integrado no ambiente digital, enquanto outras, não. E isso por muitas razões, e nem é por defeito ou maldade, mas simplesmente não chegaram ao alcance de compreender essa força do ambiente digital. Então é muito diferente. No conjunto nós ainda não chegamos lá.

 

A Igreja do Brasil, na assembleia dos bispos deste ano, pensou o documento sobre a formação presbiteral. Como, de maneira factível, a preparação do clero para esse novo universo de comunicação será feita?


Penso que a força virá não por um documento. Na verdade – a gente precisa entender bem – o papel de uma diretriz não é exatamente detalhar uma formação, é dar um rumo, uma direção. Acho que nisso esse último documento vai dar um rumo. Não penso que seria papel das diretrizes estabelecer o como seria o desenvolvimento de todo o trabalho de formação nessa área.

 

Agora, a partir das diretrizes, o papel tem que ser dos formadores, daqueles que estão nos seminários, os responsáveis pela formação dos presbíteros. Eles devem compor um quadro que possa oferecer aos presbíteros uma condição de compreender bem esse novo universo. Nesse sentido, acho que as diretrizes vão ajudar muito porque ela oferece o rumo, a direção, a necessidade desse tipo de formação. Agora cabe a cada um que tem responsabilidade nesse campo, os seminários, as congregações, as dioceses, de pensarem programas. Aí já não é questão de diretriz, mas uma questão de detalhar, programar, nessa área que é muito urgente e que todos os padres precisariam ter.

 

Além de uma formação básica nesse campo, arrisco dizer que os padres precisam ter uma experiência mais aprofundada. É muito fácil perceber que os padres entram mais ou menos como o grande público. Faz-se um perfil, começa uma coisa, começa outra, mas a gente ainda não tem muita consciência do potencial tanto negativo quanto positivo que tem esse universo. Isso só vai ajudar a partir da experiência; além da informação, a experiência.

 

Por Gilmar Pereira/ Redação Dom Total

 

 

Fonte: http://www.domtotal.com

 

 

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